
A migração é um fenómeno global premente, interligado com direitos humanos, sustentabilidade, desenvolvimento económico e geopolítica. Tem um inegável impacto na gestão e implicações importantes nas atividades, estratégias, estruturas e processos de tomada de decisão das empresas. É também um desafio para as universidades que não devem ignorar este conceito de limiar, integrando-o nos planos curriculares e remodelando a forma de pensar dos académicos sobre as relações complexas e, nalgumas situações, paradoxais entre organizações, estados e sociedade civil.
A migração é um dilema a vários níveis. No mercado de trabalho, segundo a OIM (International Organization for Migration), se por um lado, os trabalhadores representavam cerca de dois terços do número total de 281 milhões de migrantes em 2021, por outro, há escassez crescente de trabalhadores. Isto torna a migração de mão de obra um tópico importante para todos, desde as indústrias e empresas, às sociedades anfitriãs onde as reações anti-imigração, os incidentes de violência xenófoba e o tráfico de mão de obra e também manifestações contra este tráfico e a favor dos direitos dos trabalhadores migrantes convergem. A procura crescente por mão de obra tem tido também reflexos na formulação de políticas, sobretudo nos países recetores de migrantes onde estas políticas se tornaram, nalguns casos, mais restritivas nos últimos anos.
Na comunicação social e nos debates políticos, a tensão entre a procura por mão de obra migrante e a perceção pública dessa migração como um problema são descortináveis.
Na investigação, é aparente a ausência e/ou incipiência de estudos multidisciplinares que sustentem do ponto de vista técnico e científico o fenómeno da migração e o seu impacto para a gestão. Importa sobretudo analisar e perceber as inter-relações entre migração, negócios e sociedade, porque a migração interage com muitos outros aspetos, como a liderança, a estratégia, a ética e responsabilidade social, o empreendedorismo e, a gestão intercultural e de recursos humanos.
Ao nível da Sustentabilidade, conforme patente nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas, existe uma relação robusta entre migração e desenvolvimento sustentável. Relação esta dependente dos: 1) estados que definem as políticas relacionadas ao movimento de pessoas, equilibrando-as a pressões de outras partes interessadas, como o setor privado e a sociedade civil; 2) industriais e empresários que solicitam redução das barreiras à imigração pela necessidade de mão de obra e/ou de limitações sindicais; 3) processos de recrutamento de recursos humanos e das questões de atração de candidatos migrantes suficientes e retenção dos contratados; 4) migrantes, quando podem tomar as suas próprias decisões sobre onde trabalhar, por quanto tempo e em que condições.
Daí que acomodar todas estas questões, incluindo a migração em geral e o tráfico de mão de obra agrícola, em particular, seja uma preocupação e, por isso, um dos temas de intervenção primários, no âmbito do PSAA (Programa de Sustentabilidade do Azeite do Alentejo), um projeto da Olivum – Associação de Olivicultores do Sul, em parceria com a Universidade de Évora e a CONSULAI, para o qual se buscam possíveis soluções. Entre estas, o repensar e redesenhar as práticas de contratação e a criação de normas de boas práticas para o recrutamento e contratação de mão de obra, em geral e, em particular, dos trabalhadores migrantes.
Afere daqui a importância capital do papel do PSAA no auxílio à resolução de alguns dos problemas inerentes à migração de trabalhadores e ao combate ao tráfico de mão de obra agrícola. Do ponto de vista empresarial importa: 1) fazer a distinção entre empresas de prestação de serviços e empresas de trabalho temporário; 2) adotar uma tipologia de liderança responsável; 3) refletir sobre e ajustar processos de formação de identidade multicultural, criação de sentido e aculturação, entre outros; 4) compreender como os ativos de capital humano são vinculados à localização e acessíveis a todas as empresas estabelecidas naquele local; 5) perceber de que forma a migração modificou o equilíbrio das vantagens de capital humano específicas do Alentejo. Isto porque as mudanças nos padrões de migração internacional também induzem mudanças (nalguns casos inesperadas) na vantagem competitiva das empresas, dos países e regiões recetores e emissores de migrantes.
O envolvimento empresarial na gestão dos recursos humanos e, mais especificamente, na força de trabalho migrante passa assim por várias interseções, de políticas comunitárias e nacionais e da confiança das empresas nos migrantes e no regime de imigração, económicas, de comércio e empreendedorismo, multissetoriais, de empresas e industrias com organizações intergovernamentais, académicas, sociedade civil e as cadeias de valor globais e, socioculturais, refletindo ou remodelando as atitudes de todos em relação à temática em causa. Isto porque a migração é e continuará a ser uma característica permanente do crescimento económico e da mudança social, em estreita relação com os negócios, a sociedade e a sustentabilidade. Daí o PSAA querer estar na vanguarda, dando a merecida atenção à migração de trabalhadores e a todos os processos de contratação de recursos humanos.
Dezembro 22, 2022